Prémio Escalão 3.º Ciclo | Caiado S.A.:
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Grupo “Os Teenagers
-Que seca, temos mesmo que fazer isto? Com este tamanho, esta história de amor parece-me mais a segunda edição da Bíblia! - resmungou o Miguel.
-Não sejas assim, Miguel. Isto é muito mais do que uma história de amor, isto é...
-Oh! Cala-te, Carolina! Pára com isto. Estás a deixar-me nauseado! “Romeu e Julieta”... uma seca! Estes livros nem deviam ser vendidos, são um atentado à realidade!
-Não sejas parvo! É uma história bonita, se a leres, claro... - argumentou Mariana. -Imagina que és o Romeu e que perdeste o grande amor da tua vida... tu também tens que sentir e ouvir a história, não apenas lê-la. - terminou ela.
-Eu, o Romeu? Só podes estar a gozar! Ele é moreno, eu sou loiro, ele tem os olhos castanhos e eu tenho uns olhos lindos azuis. Oh... quem será o mais belo?
De repente, a porta da biblioteca abriu-se, e por trás dela surgiu Cátia, a menina gorda da turma, que (para não variar) vinha a chorar. Os seus olhos pareciam procurar alguém. Nesse instante, fixaram a mesa junto à janela na qual o Miguel, a Carolina e a Mariana estavam sentados. Aproximou-se deles.
-O que se passa, minha querida? - perguntou a Mariana.
-Ele não quis nada comigo...humilhou-me! - respondeu a Cátia, intercalando as suas palavras com soluços.
-Oh...pronto, pronto minha querida, já passou! - disse a Mariana, abraçando-a para a tentar reconfortar.
-O que esperavas? Olha bem para ti, tu és o Shrek versão feminina, ninguém quer namorar um ogre! - exclamou o Miguel com ar ofensivo.
-Miguel! - berrou a Carolina...seu idiota, sai...sai já daqui !- ordenou ela.
-Com muito gosto! - respondeu ironicamente.
-Meninos, o que vem a ser isto? Não vêem que estão numa biblioteca?! Quase parece um palco de teatro! Vamos lá sossegar, quero silêncio! - disse a senhora Gracinda, a bibliotecária.
-Desculpe, senhora Gracinda! - respondeu a Mariana.
O Miguel aproveitou para sair. Pegou na sua mochila, que permanecia fechada em cima da mesa, e saiu.
Estava a chover. Atravessou a rua a correr, mas tropeçou em algo... num livro, num grande livro. Pegou nele, não tinha nada: nem capa, nem nome, nem autor, nada...rigorosamente nada. Começou a folheá-lo e de repente algo aconteceu... O Miguel começou a ser sugado para dentro do livro. Começou a gritar, mas ninguém o ouviu e depois desmaiou.
-Olá! - exclamou uma voz.
-Quem és tu? Onde estou eu? - perguntou ele.
-Estás no livro. - respondeu a voz.
-No livro?! O que é isso? Algum país do terceiro mundo?
-Não, meu querido. Mas isso agora também não interessa. Levanta-te e vem comigo.
Nesse instante, o Miguel conseguiu ver tudo com nitidez. Estava à frente de uma mulher ruiva, atraente e com grandes olhos verdes. Ele seguiu-a até uma grande sala que tinha apenas uma secretária com um livro velho em cima.
-Pega nele! - ordenou-lhe a mulher.
O Miguel obedeceu, pois aquela mulher, para além de bela, era assustadora e fazê-la zangar-se não era a melhor opção. Começou a ler o livro:
“Era uma vez um rapaz chamado Miguel que era muito cruel e só pensava nele próprio. Era mau, muito mau mesmo e afastava todas as pessoas que se aproximavam dele com o seu mau génio”.
O Miguel não estava a gostar da história, por isso avançou até à ultima página (o que já era seu hábito).
“E Miguel morreu completamente sozinho na sua imensa solidão”.
Ao perceber que aquela história falava sobre ele, fechou o livro com brusquidão. Antes de poder dizer uma única palavra, as luzes apagaram-se e começou a ouvir vozes. Eram-lhe familiares, mas não sabia dizer exactamente de quem eram...Oh não! Eram as vozes dos seus amigos: da Carolina, da Mariana, da Cátia e de outras pessoas mais. “Ele é tão cruel, não sei como é que ainda sou amiga dele!”, “É um verdadeiro poço de egoísmo, assim não vai acabar bem!” “É tão insensível, pergunto-me sobre o que terá no lugar do coração, será uma pedra?”, “Será possível existir assim uma pessoa tão má?”. Ouvir estas frases tinha doído.
-E sabes o que é mais deprimente? - perguntou a ruiva – É que estas opiniões vão crescendo de dia para dia, vão ganhando cada vez mais força, é isto que queres, Miguel?
O Miguel nem conseguia falar. Aquelas duras palavras estavam-lhe cravadas na garganta, aquela história...nunca tinha sentido uma dor assim...
-Pensa bem no que estás a fazer, Miguel, um dia não haverá retorno!
Dizendo isto, a ruiva estalou os dedos e o Miguel reparou que estava de novo no meio da rua. Ler aquele livro, ouvir aquelas vozes e sentir aquela angústia, fê-lo mudar. Levantou-se e dirigiu-se à biblioteca disposto a dar conhecer um novo Miguel aos seus amigos. Pelo caminho pensou na sorte que tivera ao encontrar um livro que lhe mudara a vida. Percebeu que os livros não servem simplesmente para decorar estantes. O seu tesouro escondido no meio de todas as páginas, palavras e letras... Para descobrir o tesouro, é importante ler, ouvir e acima de tudo sentir o livro. Esse sim... é o segredo!
Carina Santos Simão, Miguel Ângelo Bajouco, Sofia da Silva Santos) - Colégio Senhor dos Milagres